A compra de imóveis na planta, ou em etapa de construção, é uma das opções mais atraentes para quem deseja realizar o sonho da casa própria ou investir no médio prazo, mas há sempre o risco de atraso.
Normalmente, o comprador espera a entrega das chaves dentro prazo estipulado no contrato, mas, ainda que considerada eventual tolerância pactuada, a expectativa acaba sendo frustrada pelas incorporadoras responsáveis pelo empreendimento imobiliário.
Seja por enchentes, seja por flutuações do mercado imobiliário, há sempre uma justificativa que busca repassar o risco para o comprador.
O que é considerado atraso?
Quando se trata de empreendimentos imobiliários, atraso é a demora na conclusão para além do período contratado.
Todo empreendimento possui um cronograma – contratualmente previsto –, que deve ser cumprido em um intervalo de tempo, mas é comum que algumas situações impliquem em refatoração do plano.
Por isto, convencionou-se a fixação de tolerância contratual, um prazo pré-fixado de extensão do marco de entrega: antes de considerar o empreendimento em atraso, computa-se a tolerância.
Consolidando a construção jurisprudencial, o art. 2º de Lei nº 13.786/2018 alterou o art. 43 , da Lei nº 4.591/64, fixando a tolerância em 180 dias, desde que pactuada e destacada no contrato firmado entre as partes.
Note que, nos contratos com previsão de prazo de tolerância, estão nela incorporados os eventos fortuitos e imprevisíveis, de modo que, ressalvadas excepcionalidades, a ocorrência deste tipo de evento não implica adição de mais prazo para além do tolerável contratualmente.
Impossibilidade de transferência do risco negocial
As incorporadoras são responsáveis pelos eventos previsíveis que prejudiquem ou atrasem o cronograma das obras já iniciadas, pois estes já devem estar computados dentro do prazo regular da obra.
Em alguns casos, também serão responsáveis pelos eventos imprevisíveis, mas prováveis, como no caso de enchentes ou chuvas prolongadas em regiões historicamente afetadas.
Isto se dá porque as cabe àquele que organiza a produção os riscos dela derivados, de modo que aplicável a Teoria do Risco-Proveito, afastando-se a transferência dos riscos da operação.
Se sei que vai atrasar, preciso esperar o fim da tolerância?
Como exemplo, vamos imaginar a seguinte situação:
Augusto adquire um imóvel na planta com data de entrega definida, admitindo-se tolerância de 180 dias.
Poucos meses antes de encerrar o prazo para entrega do imóvel, Augusto visita o empreendimento e nota que a obra sequer foi iniciada.
Como no exemplo, em algumas situações é possível concluir que a incorporadora não conseguirá entregar o empreendimento a tempo, já que – ainda que considerada eventual alteração no esforço planejado –, pela necessidade de se aumentar o investimento para acelerar a construção, o empreendimento restaria inviabilizado economicamente.
Nestes casos, quando há impossibilidade absoluta de cumprimento do contrato, não há necessidade de se esperar o esgotamento da tolerância. É possível resolver o contrato de imediato.
Consequências do atraso
A fim de mitigar os efeitos negativos do atraso do empreendimento, o comprador pode optar por encerrar o contrato ou mantê-lo, sendo indenizado quando da entrega das chaves.
Optando por encerrar o contrato, deverá ser reembolsado em até 60 dias por tudo o que pagou, com juros e correção, mais a multa contratal.
Em situações excepcionais, deverá, também, ser rereparação de eventuais perdas e danos derivados do descumprimento contratual.
Caso o comprador escolha manter o contrato e aguardar um pouco mais, deverá ser indenizado quando receber o imóvel, em quantia equivalente a 1% do valor pago por mês de atraso, aplicando-se atualização.
Estas considerações forma aplicadas, em 18/07/2023, pela Segunda Câmara Cível do Estado do Acre, ao julgar caso de atraso na entrega das imóvel.
Na ocasião, reconheceu a responsabilidade objetiva da construtora ré, condenando-a a indenizar o comprador pelos danos causados e a ressarcir, com juros e correção, os valores pagos (v. Acórdão ).
Ao fundamentar, o Tribunal entendeu que a demora relacionada à dificuldade na aprovação de financiamento e flutuações no mercado imobiliário não eram suficientes para justificar o atraso e afastar a responsabilidade.
Considerações
É recomendado que nas relações comerciais as partes busquem o resultado pretendido ao negociar e fechar um contrato.
Acidentes acontecem e, antes de optar por encerrar um contrato ou litigar, é importante buscar uma solução negociada – a depender do caso, é o necessário e suficiente para resolver o problema.
Se ainda permanece, na relação negocial, a confiança de que o empreendimento será entregue, sem risco de perda de qualidade ou de falência da incorporadora, o acordo é uma opção viável.
Considere, também, que neste tipo de negócio, é importante avaliar o comportamento das outras pessoas que compraram unidades imobiliárias no empreendimento afetado.
Deve existir, portanto, uma unidade de desígnios, já que se parte considerável dos contratantes pedir o dinheiro de volta, provavelmente o empreendimento falhará, tornando inviável a opção por manter o contrato e receber, posteriormente, a indenização pelo atraso.
Há, também, o risco de a empresa iniciar uma recuperação judicial ou falência, caso em que os indecisos, que deixaram para tomar alguma atitude por último, podem acabar sem receber nada.